O final do século XX e o início do XXI são conhecidos como uma época de discussão sobre temas considerados como tabus e delicados. Diariamente vemos pessoas falando sobre identidade de gênero, orientação sexual, preconceito social, machismo e racismo nas mídias sociais ou até mesmo em rodas de conversas. Podemos considerar isso como algo positivo, pois damos visibilidade e estabelecemos um intercâmbio de visões sobre realidades e vivências, gerando a empatia e o entendimento do outro – pelo menos na maior parte dos casos.
Estas lutas contra esses preconceitos se dão pela forte vontade de mostrar que as discriminações não possuem nenhum fundamento lógico ou alguma justificativa, que eles são apenas consequências da intolerância, ignorância ou manipulação ideológica.
Tudo muito bom, tudo muito lindo, porém nesta luta ainda é deixado de lado um tipo de preconceito muito recorrente na sociedade brasileira: o preconceito linguístico. Que ao contrário dos anteriormente citados, esse é, em grande medida, invisível, poucas pessoas o percebem, falam dele ou sequer reconhecem sua existência. Como qualquer outra forma de discriminação, essa despreza e humilha, logo não podemos considerar este preconceito como menos importante que os demais.
O preconceito linguístico no Brasil se dá por meio de diversos mitos que estão cravados na nossa sociedade e que passamos adiante como reais sem perceber. Esses mitos vão desde afirmações de como “é preciso saber a gramática para falar e escrever bem” até “pessoas sem instrução falam tudo errado”, tais mitos são apresentados por Marcos Bagno em seu livro “Preconceito Linguístico: o que é, como se faz. ”
O que devemos compreender sobre qualquer idioma é que ele terá variações linguísticas, tanto referentes ao sotaque quanto a maneira de escrever e a escolha de palavras em uma frase. Essa variação ocorre porque a língua viva não é estática, ela tem a necessidade de evoluir e se modificar conforme o contexto que está inserida, a linguagem se adapta aos seus falantes. Se até a língua se adapta para melhor fluir a comunicação, por que uma pessoa não pode fazer o mesmo?
Além de dividir as pessoas, o preconceito linguístico cria uma barreira psicológica na comunicação, ou seja, a troca de informações não será feita porque um dos indivíduos dentro do processo acredita que o outro seja “menos” que ele, logo o interesse para compreendê-lo e escutá-lo acaba, então a comunicação falha. Agora imagine isso em uma proporção bem maior, em um país com uma variedade linguística absurda como o Brasil, se nós não pararmos para ouvir e compreender a linguagem do outro, respeitando sua vivência, perderemos diversos conhecimentos.
Então antes de debochar da maneira que o coleguinha pronúncia o ‘r’ ou que não usa o ‘s’ no final das palavras no plural ou até mesmo da escolha de vocábulos em uma frase, lembre-se que a intenção da fala é comunicar e não lhe agradar pelo uso da norma culta.